Inverno e olho seco: por que o clima pode piorar o problema?

O inverno pode parecer sedutor para quem gosta de frio, mas é a pior época para quem tem […]

O inverno pode parecer sedutor para quem gosta de frio, mas é a pior época para quem tem a síndrome do olho seco. A doença, que atinge cerca de 18 milhões¹ de brasileiros, tende a piorar durante esta estação, intensificando sintomas como a inflamação dos olhos.

“É ruim até para aqueles que não têm qualquer desconforto em outros momentos do ano, mas podem passar a senti-los durante o inverno”, comenta Dra. Monica Alves (CRM 95442-SP), oftalmologista, especialista em superfície ocular e olho seco.

Essa relação se dá por conta da baixa umidade relativa do ar, característica do período invernal, em algumas regiões do país. “Se o tempo está muito seco, a tendência é que a lágrima vá evaporando da superfície dos olhos. Quando ela evapora, aumenta o atrito das pálpebras, ocasionando o mal-estar”, explica a médica.

Olho seco pode prejudicar a visão e trazer dificuldades às atividades do dia a dia

A lágrima, em quantidade e qualidade ideais, tem a função de lubrificar o globo ocular², além de protegê-lo de possíveis infecções e partículas de poeira³. Quando há alguma disfunção no seu processo de produção ou distribuição, desenvolve-se o problema conhecido como síndrome do olho seco.

“Alguns estudos avaliam o impacto de diferentes patologias na qualidade de vida dos pacientes. O impacto dessa síndrome é semelhante a doenças como a angina⁴, uma manifestação de doença arterial que causa fortes dores no peito. Este fator tem a ver com a intensidade dos sintomas, se arde, se coça, se fica vermelho e se lacrimeja. Mas o indivíduo pode ter dificuldade nas atividades diárias⁵, como trabalhar, ler e ficar num ambiente com ar-condicionado”, conta a especialista.

Também é importante ressaltar que, em formas graves, a condição pode repercutir na qualidade da visão.

Doença é 2x mais comum em mulheres

Uma lista extensa compõe os fatores de risco para o aparecimento da síndrome do olho seco⁶, entre eles:

– Envelhecimento, uma vez que as glândulas que produzem o componente da lágrima vão diminuindo a produção com o passar dos anos, o que afeta a qualidade e quantidade da lágrima;

– Gênero, pois mulheres têm 2x mais chances de conviver com o olho seco, devido a fatores hormonais, menopausa, uso de anticoncepcional e terapia de reposição hormonal;

– Doenças sistêmicas, como as reumatológicas e de pele, bem como seus tratamentos e medicações;

– Uso de ansiolíticos, antidepressivos, antialérgicos e diuréticos, que impactam na produção da lágrima e diminuem sua secreção;

– Cirurgias tidas como rotineiras, a exemplo de correção de miopia, catarata e cirurgia plástica de pálpebra, que podem alterar a qualidade e quantidade lacrimal;

– Alguns tipos de colírios para doenças oculares, que possuem conservante tóxico para a superfície ocular e, por isso, precisam ser monitorados;

– Fatores ambientais e comportamentais, como o clima, poluição, ar-condicionado, exposição excessiva à telas – este último por diminuir a frequência do piscar.

– Utilização de lentes de contato⁷. “Quando colocamos a lente na córnea, separamos a lágrima que precisa ficar espalhada da superfície dos olhos. Esse uso provoca um mecanismo de adaptação que diminui a sensibilidade da córnea, justamente quem vai estimular a secreção da lágrima e, quando reduzida, ocasiona uma secura nos olhos”, relata Dra. Monica Alves.

Por isso, é essencial que o paciente esteja atento a sinais de irritação e incômodos ao colocar a lente, assim como lubrifique os olhos, tenha cuidados com seu uso correto, troca regular e número máximo de horas com o dispositivo.

Diagnóstico do olho seco envolve várias fases

Os sintomas do olho seco são semelhantes aos de outros distúrbios oculares, mas análises complementares e histórico do indivíduo ajudam na detecção do problema.

“Olho seco tem a ver com fatores de risco e, normalmente, queixa de ardência, irritação e sensação de areia nos olhos². Ele faz com que haja a perda do mecanismo de limpeza da superfície, algo que a lágrima também faz, expondo a região a mais quadros alérgicos e infecciosos”, pontua a oftalmologista.

Apesar de não haver um exame específico para sua identificação, o médico responsável pelo caso pode obter uma definição ao questionar e quantificar as características observadas.

“Hoje temos equipamentos que medem quanto de água e óleo há na lágrima, quanto tempo ela fica estável na frente do olho, qual a frequência do piscar, como estão as glândulas que produzem óleo da lágrima, colírios que detectam um ressecamento, entre outros elementos que contribuem para o diagnóstico da doença”, diz Alves.

Tratamento envolve várias fases e varia de acordo com o quadro⁶

Para controlar o olho seco, primeiro é preciso identificar que fatores de risco o paciente tem e quais podem ser modificáveis.

“Olho seco moderado a grave não tem cura, mas é controlável. A medicação inicial é composta por lubrificantes, que variam de acordo com o quadro apresentado: o olho seco por deficiência aquosa, quando falta camada aquosa da lágrima, e o olho seco evaporativo, que ocorre por deficiência lipídica (óleo), irão contar com medicamentos de componentes produzidos em glândulas diferentes. Então, o paciente pode precisar de um ou de ambos”, conclui a médica.

Ainda podem ser recomendados:

– Substitutos biológicos da lágrima, a exemplo de colírios feitos com sangue da própria pessoa em recuperação, onde o plasma é filtrado e sua composição se torna muito semelhante à da lágrima;

– Aplicação de plugs no canal da lágrima, a fim de impedir que ela saia da superfície do olho.

– Cirurgias⁶, a exemplo da tarsorafia, técnica que promove o fechamento das pálpebras de forma temporária ou definitiva, e transplante de membrana amniótica, uma alternativa usada para reconstruir a superfície ocular, enxerto de membrana mucosa e glândula salivar.

É válido lembrar que alguns tipos de colírios são configurados como medicação, com propósito, e não podem ser usados sem indicação adequada. Por isso, a visita regular ao oftalmologista é essencial.  

Por fim, para prevenir o olho seco, são recomendados os umidificadores para ambiente, a intensificação dos cuidados com a limpeza da pálpebra e o hábito de beber bastante líquido.

Referências:

1.  Associação Brasileira de Portadores de Olho Seco (Apos)

2. Instituto de Moléstias Oculares. Disponível em: https://imo.com.br/sindrome-do-olho-seco/. Acesso em 20/07/2022

3. Conselho Brasileiro de Oftalmologia. Revista Veja Bem. Edição 9, ano 04, 2016. Página 20 Disponível em: http://www.cbo.com.br/novo/publicacoes/revista_vejabem_09_leitura.pdf Acesso em 20/07/2022

4. Instituto de Moléstias Oculares. Disponível em:  https://imo.com.br/doenca-de-olho-seco-e-diabetes-estudo-revela-necessidade-de-triagem/#:~:text=Sabe%2Dse%20que%20o%20olho,quadril%20ou%20em%20di%C3%A1lise%20renal. Acesso em 20/07/2022

5. American Journal of Ophthalmology – Volume 143, Issue 3, Pages 409-415.e2 (March 2007) – Impact of Dry Eye Syndrome on Vision-Related Quality of Life – Biljana Miljanovic?, Reza Dana, David A. Sullivan, Debra A. Schaumberg

6. Fonseca, Ellen Carrara, Arruda, Gustavo Viani e Rocha, Eduardo MelaniOlho seco: etiopatogenia e tratamento. Arquivos Brasileiros de Oftalmologia [online]. 2010, v. 73, n. 2 [Acessado 20 Julho 2022] , pp. 197-203. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0004-27492010000200021>. Epub 12 Ago 2010. ISSN 1678-2925. https://doi.org/10.1590/S0004-27492010000200021. 7. Sociedade Capixaba de Oftalmologia. Disponível em: http://www.sco.cbo.com.br/saude.php?n=2. Acesso em 20/07/2022

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Você precisa ficar de olho no ceratocone

Doença, mais comum na adolescência e início da vida adulta, é um dos principais motivos para transplante de […]

Doença, mais comum na adolescência e início da vida adulta, é um dos principais motivos para transplante de córnea

A adolescência e início da vida adulta são fases de muitas transformações: o corpo sofre mudanças, novas opiniões passam a ser formadas, são dados os primeiros passos no mercado de trabalho e muito mais. Imagine se, além de todos esses fatores, ainda fosse necessário lidar com um diagnóstico de ceratocone. O que você faria?

Esse é o caso de aproximadamente 150 mil brasileiros todos os anos, afetados pela doença ocular rara, genética, hereditária e com evolução lenta, que se manifesta com mais frequência entre os 10 e 25 anos¹, mas pode se desenvolver até os 30 ou 35 anos³. 

“O ceratocone provoca uma lesão na córnea, a camada fina e transparente que recobre toda a frente do globo ocular, causando uma deformação progressiva que afina e aumenta a curvatura dessa estrutura. Ela, que era até então redonda, passa a ter um formato de cone. É por isso que a doença tem esse nome”, explica o Dr. Renato Ambrósio Júnior (CRM 52.62107-2 RJ), médico oftalmologista com vasta experiência em ceratocone.

O problema é que tal condição, ainda desconhecida por muita gente, pode comprometer seriamente a visão caso não seja diagnosticado e tratado precocemente².

“Entretanto, apesar de poder levar à perda de visão bastante acentuada, a boa notícia é que o ceratocone não costuma levar o paciente à cegueira”, pontua o médico.

Identificando o ceratocone

O ceratocone costuma acometer os dois olhos de maneira assimétrica, ou seja, um pode ser mais prejudicado que o outro. O distúrbio também costuma apresentar alguns sinais que podem ajudar na sua identificação³. Entre eles:

– Desconforto visual;

– Dor de cabeça;

– Fotofobia;

– Coceira nos olhos;

– Visão distorcida e/ou embaçada.

Dor e inflamação, a exemplo de vermelhidão nos olhos, não são características típicas. Mas o hábito de coçar os olhos, ainda que não seja um sintoma, é bastante comum.

“O ceratocone ocorre com a associação de questões genéticas e hereditárias, mas seu agravamento está relacionado a traumas repetitivos. Nesse sentido, alergias oculares podem ter ligação e coçar os olhos é um fator de risco para o aparecimento ou piora da doença”, explica o doutor.

O paciente ainda pode apresentar miopia e astigmatismo⁷, que aumentam com o ceratocone e demandam a troca constante de óculos³. Entretanto, o diagnóstico pode ser obtido na fase inicial em pessoas que não apresentam qualquer tipo de sintoma.

Em todos os cenários, a consulta regular com o oftalmologista é peça-chave para a descoberta do problema. Exames complementares, como a Topografia Corneana Computadorizada – análise que faz um mapeamento mais minucioso da superfície da córnea –, podem ser solicitados.

Tratamento pode envolver uso de óculos, colírios e até transplante de córnea³

Dr. Renato Ambrósio, que também é idealizador da campanha Violet June (em português, Junho Violeta) de conscientização do ceratocone, conta que o tratamento depende da progressão da doença.

“O tratamento de alergias associadas e o trabalho de educação para evitar coçar os olhos são essenciais para evitar que a condição continue piorando. Para melhorar a visão já comprometida, os óculos são a primeira opção de correção”, relata o especialista⁴.

Quando a correção não é suficiente pelos óculos, podem ser indicados diferentes tipos de lentes de contato especiais³. Elas, porém, não impendem que o ceratocone progrida.

Se o resultado ainda não é satisfatório, alguns métodos cirúrgicos passam a ser considerados. São exemplos:

 – Implante de anel intracorneano⁸: técnica onde um dispositivo médico implantável é posicionado em uma região conhecida como estroma corneano, buscando regularizar as deformações presentes na córnea⁹

– Cross-linking da córnea⁵: é depositada na córnea uma solução contendo vitamina B2, junto a uma exposição controlada à radiação ultravioleta (UVA). O objetivo é estimular a contração das fibras de colágeno presentes na córnea, reforçando e aumentando a sua resistência.

O ceratocone é um dos principais motivos de transplante de córnea, realizada em último caso e somente em graus elevados⁶. “Não é possível prevenir seu aparecimento, mas é possível eliminar costumes que prejudicam a saúde ocular e evitar, quando descoberta em tempo, o transplante”, finaliza o oftalmologista.

O texto acima possui caráter exclusivamente informativo. Jamais realize qualquer tipo de tratamento ou se automedique sem a orientação de um especialista

Referências

1. Ministério da Saúde. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/10-11-dia-mundial-do-ceratocone/. Acesso em 21/06/2022

2. National Keratoconus Foundation (NKCF). Disponível em: https://www.keratoconusgroup.org/2021/10/world-keratoconus-day.html. Acesso em 21/06/2022

3. Violet June – The Keratoconus Awareness Campaign. Disponível em: https://www.violetjune.com.br/ceratocone/. Acesso em 21/06/2022

4. Ambrósio, Renato et al. Ceratocone: Quebra de paradigmas e contradições de uma nova subespecialidade. Revista Brasileira de Oftalmologia [online]. 2019, v. 78, n. 2 [Acessado 21 Junho 2022] , pp. 81-85. Disponível em: <https://doi.org/10.5935/0034-7280.20180101>. Epub 13 Maio 2019. ISSN 1982-8551. https://doi.org/10.5935/0034-7280.20180101.

5. Sociedade Brasileira de Oftalmologia Pediátrica. Disponível em: https://sbop.com.br/paciente/doenca/ceratocone/. Acesso em 21/06/2022

6. Sociedade Brasileira de Oftalmologia. Disponível em: https://www.sboportal.org.br/campanhas/dia-mundial-do-ceratocone. Acesso em 21/06/2022

7. Sociedade Brasileira de Ceratocone. Disponível em: http://www.ceratocone.net.br/. Acesso em 21/06/2022

8. Violet June – The Keratoconus Awareness Campaign. Disponível em: http://www.violetjune.com.br/wp-content/uploads/2019/11/Captura-de-Tela-2019-11-07-%C3%A0s-09.50.00.png. Acesso em 21/06/2022

9. Moreira, Hamilton et al. Anel intracorneano de Ferrara em ceratocone. Arquivos Brasileiros de Oftalmologia [online]. 2002, v. 65, n. 1 [Acessado 21 Junho 2022] , pp. 59-63. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0004-27492002000100011>. Epub 23 Jul 2002. ISSN 1678-2925. https://doi.org/10.1590/S0004-27492002000100011.

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